INDISCIPLINA
CÍVICA
Durante largo
tempo, a comunicação social escalpelizou a cadente questão da mudança de nome
do aeroporto de Santa Catarina para CR7. Passado o ruído, rapidamente a atenção
das pessoas foi desviada para outros factos.
Desta vez, o
assunto é bem mais sério. A Comunicação Social deu-nos conta de actos de
indisciplina cívica que, pondo em causa a segurança de pessoas e bens, a todos
preocupa. Temos por adquirido que cabe ao Estado o uso da força, nos limites da
lei, para nos garantir que nada de mal nos acontece. É essa disciplina cívica
que leva o Estado a gastar dinheiro nas viaturas da PSP com a inscrição Escola
Segura.
O mediático
futebol, de repente, acordou para a violência que, grassando desde há muito, sempre
se ignorara. Juntou-se-lhe o “clássico” das Férias de Páscoa em Espanha. Nenhum
destes factos que agora extravasaram para a comunicação social é novidade. Enquanto
eles se limitaram a aparecer em pequenas notícias dispersas não demos conta de
nada. Quem não se recorda de ler/ver notícias de espectáculos futebolísticos
onde ocorreram mortes? Quem nunca viu enquadramentos policiais de
frequentadores de espectáculos futebolísticos como se de “guerreiros” se
tratassem? Quem não se recorda de, em Páscoas anteriores, ter lido notícias de
desacatos feitos por estudantes?
Dar o nome do
Cristiano Ronaldo ao aeroporto, não interfere directamente connosco. Pode bem a
questão ser tratada sem reflectirmos sobre ela. Diferente, muito diferente, é
não reflectirmos sobre a formação dos nossos jovens, ou admitirmos que se coloquem
em risco Pessoas e Bens. Nestes casos urge ir ao cerne da questão. Cabe, à
Comunicação Social, para mais numa sociedade com apenas 43 anos de Liberdade de
Expressão, uma função didáctica para que os cidadãos distingam o essencial do
acessório.
Estaremos nós a
garantir uma boa formação aos nossos jovens? Não lemos, não vimos, nem ouvimos
notícias que, há anos, nos dão conta de bulling nas escolas, de papás
indignados que, impunemente, ousam esbofetear Profs. por cometerem o “crime”
de não deixarem os educandos usarem o telemóvel nas aulas? Quantas
notícias vimos/lemos de professores com problemas do foro psíquico pelo
desrespeito permanente de que eram vítimas nas escolas? A comunicação social,
muita dela, deu estas notícias, outra (mais do que seria desejável) escondeu-as.
Acho que nenhuma comunicação social – comentadores incluídos – fez pensar as
pessoas sobre as consequências desta demissão de quem mandava. Gerámos e
gerimos, em 43 anos, um sistema educativo, onde filhos e netos ficaram
adolescentes – não assumem a responsabilidade dos seus actos – a vida inteira. Alguém,
os eleitos por nós na companhia dos nomeados para coadjuvá-los na Administração
Pública, deveria estar atento a este Interesse Colectivo que é formar Cidadãos
responsáveis.
O futebol, nos
nossos dias, beneficia de facilidades financeiras, impensáveis no passado. Vive
em mancebia com a especulação financeira gerando negócios que, em última
instância, podemos acabar pagando. Basta que as avultadas dívidas de muitos
clubes à banca, obtidas na promiscuidade entre os poderes político e
financeiro, se transformem em imparidades para sermos chamados a pagar. Os
clubes fazem vida de ricos, e criam poderosas centrais de propaganda que, alimentando
o mito do “amor à camisola” junto dos fervorosos adeptos, os levam a confundir
desporto com espectáculo futebolístico. Foi notícia, não desmentida, que o
responsável pela propaganda de um dos clubes do nosso futebol aufere um salário
de € 5.000 mês. O felizardo, se calhar declara, para o IRS, o salário mínimo. Quem
manda aceita e promove estas aberrações.
Não parece, eu
sei, mas a sociedade da riqueza virtual em que vivemos está perigosa. Os
jovens, a quem tudo facilitámos, tornaram-se irresponsáveis e, mais grave,
ficaram sem futuro graças a pusilanimidade vigente. A sociedade do futuro
estará ainda mais dividida entre aqueles que serão remunerados a partir da
riqueza financeira – começando no Goldman Sachs, acabando no hiper-bem-pago
director de comunicação do clube de futebol – com os profissionais das várias
actividades, possuidores de formação superior, pagos pelo salário mínimo ou desempregados
dependurados na magra reforma dos pais.
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