QUE É
A PÁTRIA?
Um
velho dicionário Francisco Torrinha, dos meus tempos de estudante, esclarece: “s. f. País em que nascemos; terra da
naturalidade”. Conceito simples, mas só na aparência! Num País como o nosso,
com fronteiras sem grandes alterações territoriais desde a sua Fundação, o imaginário
colectivo vive povoado de Heróis e Mártires que tudo fizeram para nos
garantirem este Legado. Não há aqui qualquer originalidade. Estamos, pelo
contrário, na presença de um elemento comum a todas as Pátrias Europeias. Os
heróis e mártires, resultantes do contubérnio entre Igreja e Poder Temporal, ganham
maior fulgor naqueles casos em que as disputas territoriais se fizeram sentir
com maior intensidade que em Portugal. Foi assim, desde o séc. XI, a vida
colectiva na Europa.
A
partir do sec. XV, nas disputas territoriais fora da Europa, implantou-se o
modelo europeu como materialização dos apetites geo-estratégicos das Coroas do
velho Continente. No sec. XIX com Napoleão e, mais tarde já no sec. XX, com a
1ª Guerra Mundial e a Revolução bolchevique na Rússia, o Mundo mudou. O
“racismo” intrínseco ao sangue azul do passado, baia que garantira privilégios
durante séculos, cedia o seu lugar a coisas tão simples como esta: “Os homens
nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem
fundamentar-se na utilidade comum.” Setecentos anos separam os heróis
e mártires da frase acima transcrita dos Direitos do Homem e do Cidadão e,
embora aos menos avisados escape, vivemos as sequelas deste confronto de ideias.
É aqui que reside o nó górdio do nosso futuro colectivo.
O fio
condutor que liga o passado ao presente, e à tentativa de perscrutar o futuro,
encontramo-lo no modo como o Poder Político se organiza. Não sou consumidor de
novelas, mas algumas vezes parei para apreciar algumas cenas da novela
Portuguesa Madre Paula. Questionei-me onde andaria o espírito crítico das
audiências ao verem tudo aquilo. Aos detentores do Poder Absoluto – O Sr. D.
João V, no caso em apreço – não se lhes impõem limites morais, ao dicionário
retira-se o vocábulo sacrilégio, e as populações submissas tudo isso suportaram
naquele longínquo sec. XVIII. Infelizmente, em Portugal, ainda pior na Madeira,
os apáticos cidadãos, frente ao ecrã da TV, acharão que sempre foi assim, de
nada valendo lutar para que os poderosos nem sonhem julgar-se candidatos ao
Poder Absoluto. Os candidatos ao exercício do Poder, não o afirmando, adoram
não prestar contas a ninguém fazendo, tal qual D. João V, tudo que lhes vier à
cabeça. É assim com Trump, Maduro, Putin, Eduardo dos Santos etc. Respeitar a
Pessoa Humana é apenas coisa de comício eleitoral para esquecer, logo após a
contagem dos votos.
Pátria
caiu em desuso! As interligações dos Estados no séc XXI confirmam-no de modo
indelével. A velha desconfiança entre Estados Soberanos, cada um deles com seus
heróis e mártires, foi substituída por juras de colaboração com vista à obtenção
de benefícios comuns, passando a Pátria a posição secundária.
Aprendamos
com o passado. Se em tempo de “sangue azul” tudo se impunha, não podemos
reeditar, na versão sec. XXI, o “sangue dourado” dos “patriotas” que,
substituindo a velha aristocracia, nos manipulam para nos sacarem os votos que
os enriquecerão. Cada um de nós tem de pensar e agir renegando a velha condição
de súbdito de qualquer Coroa do sec. XVIII.
Os
eleitos são Cidadãos iguais a nós. Temos a obrigação de lhes impor leis,
diferentes das leis do passado, que conferiam direitos, a quem mandava, ficando
para “os outros” os deveres. Não os olhemos baixando a cabeça, respeitemo-los
na exacta medida em que nos respeitarem. Os candidatos ao Poder Absoluto –
estilo D. João V – são, nos nossos dias, todos iguais. Trump e Putin; Eduardo
dos Santos e os Sauditas; Maduro e Temer estão todos de acordo quando chega a
hora dos “negócios” ainda que daí resulte guerra fome e sofrimento para quem
neles votou.