OITENTA ANOS SÃO PASSADOS
Na primeira página da edição do dia
22 de Out., do DN local, lê-se: “Prédio da ILMA “reverte” para os
trabalhadores”. O fecho daquela unidade foi a sentença de morte num projecto
para a Madeira.
Dia 20, 5ª feira, perfizeram-se oitenta anos sobre a passagem
do navio Luanda pelo Funchal para embarcar, na sequência da revolta do leite, 52
presos da PVDE (antecessora da PIDE), com destino a Cabo Verde. Colhiam-se as tempestades
dos ventos semeados durante o tempo de Liberdade vivido entre 1910 e 1926. As elites
de então, digladiando-se em retóricas parlamentares, deixaram degenerar a vida
colectiva. Teixeira Gomes, em 1925, num jantar em Belém, falando para políticos
e militares avisava: «enquanto certos políticos da
nossa terra teimarem em pensar com o estomago e digerirem com os miolos, isto
não tem concerto possível. E o pior é que já é muito tarde para tê-lo, porque
quer os senhores queiram, quer não isto (acentuou, voltando-se à direita
para o General Carmona e tocando-lhe nos galões) vai-lhes directamente
parar às mãos». Ele anunciava a Ditadura que surgiria meses depois. Num País
instabilizado e inserido num Mundo conturbado, a vida colectiva deteriorara-se
e urgia disciplinar o País. As liberdades foram cerceadas, mas os projectos em
nome dos quais se haviam sacrificado as populações, resistiriam no tempo.
A
Madeira, na década de 30, conheceu três revoluções. Em 1939 surge o pesadelo da
2ª guerra, tornando ainda mais difíceis as condições de vida das populações. O
Governador Civil de então dizia: “a fome é sempre má conselheira e uma ameaça à
ordem pública”. Fiel às suas palavras, fez distribuir, gratuitamente, milho a
desempregados. A ordem pública de então, hoje disciplina cívica, deve preocupar
quem manda. O Turismo foi altamente penalizado, até pela redução dos barcos que
nos visitavam. Só melhorou quando se ocuparam hotéis e outras residências com pessoas
evacuadas de prováveis zonas de conflito, como Gibraltar. Predominava no grupo a
juventude feminina - as “gibraltinas” - que revolucionaram os costumes da
Madeira! O dinheiro derramado por estas pessoas teve um efeito positivo numa
economia onde ele escasseava. A Madeira, ao contrário do Continente, não beneficiou
do dinheiro da venda de volfrâmio aos Países beligerantes!
Finda a 2ª guerra, o
Estado Novo, durante 29 anos, (treze dos quais em guerra em três frentes
africanas, não discuto se bem ou mal. Tenho opinião sobre isso, mas não vem ao
caso agora) prosseguiu aquilo a que ele chamava a “valorização dos recursos
locais”. O dinheiro - esse malvado – era escasso e criteriosamente repartido.
Lembro-me que, na Guiné, “apertadinhos” com a girandola que vinda da mata nos caía
em cima, gastámos mais granadas de obus do que aquelas que a parcimónia mandava.
Não escapei ao reparo da hierarquia, ainda que muito leve. Obedecendo a estas
regras, com sérias limitações de dinheiro, valorizavam os recursos dentro de um
Plano, com Objectivos claramente expostos. Queriam turismo de qualidade. Cumpriram.
Por isso deixaram o Madeira Palácio, o Sheraton, e a Matur. Seguiram, com algum
atraso, as obras da captação de água para o regadio e abastecimento público. A
pequena indústria agro-alimentar, que tanto fizera sofrer os madeirenses,
também foi contemplada com legislação que a adaptaria às novas realidades.
Com
a implantação da Constituição de 1976, a Madeira ganhou a capacidade de gerir
os seus recursos. A escassez de dinheiro acabou. Recorrendo, de início, à
chantagem, juntando-se-lhe depois as ajudas Europeias e o crédito bancário, a
abundância de dinheiro foi uma realidade até ao estoiro final. A conciliação do
turismo de qualidade – herança do passado – com a produção agrícola criadora de
riqueza implicava cautela, pois, vendendo o turismo paisagem, ela devia ser uma
prioridade. Embriagados pelo dinheiro abundante, ganhar eleições foi objectivo
único. A Europa afogou-nos em dinheiro! Faltou-nos “prudência e tino”, a Suíça
é montanhosa e tem vacas, bem ao contrário daquilo que afirmava a propaganda –
o acidentado da ilha impossibilitaria a criação de gado – na qual se escondeu
um enorme falta de vontade política para agir. A água escassa, passou a ter como
prioridade o turismo e a propaganda tudo isto escond(eu)ia. A subsistência das
populações rurais ainda não está em perigo, mas o abandono a que votaram a
formação dos preços dos bens agrícolas regionais reflecte-se num Mercado dos
Lavradores vazio, acelerando a diabolização da produção regional.
Qual o
projecto de futuro que têm as nossas elites, apenas subordinadas à retórica
“eleiçoeira” da 1ª República? Ao cair, o Estado Novo, deixou futuro. Face a
esta realidade apetece reproduzir de Teixeira Gomes: «enquanto certos políticos
da nossa terra teimarem em pensar com o estomago e digerirem com os miolos,
isto não tem concerto possível.» Será o fim da Autonomia.
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